8 de fevereiro de 2009

A PAREDE SECRETA

A Parede


A mais escura das pedras angulares ocultas em ti mantém a tua crença na culpa fora da tua consciência. Pois nesse local escuro e secreto está o reconhecimento de que traíste o Filho de Deus por condená-lo à morte... Pois uma mente escura não pode viver na luz e tem que buscar um lugar de trevas onde possa acreditar que está onde não está... escondida em cada lugar escuro, envolta em culpa e na escura negação da inocência (T-13.II.3:1-4; T-13.III.11:5-7; T-14.VIII.1:2-4).

Essa parede preserva o ser egóico separado que percebemos como vulnerável e ameaçado. Quase todos nós carregamos memórias da infância, até dos nossos primeiros anos, de situações dolorosamente angustiantes onde fomos abusados, humilhados, rejeitados e – o pior de tudo – não amados e não cuidados. Dessas memórias, é só um pulinho para chegarmos à redutiva conclusão de que nossos sentimentos adultos de ansiedade e medo podem ser retraçados até àqueles primeiros dias de vida. Dentro dos estreitos parâmetros da nossa experiência humana, esse certamente parece ser o caso. Entretanto, ainda que pareçamos ser membros dos homo sapiens, nós realmente somos pensamentos em uma mente dividida não-temporal, não-especial, de pecado ou inocência, culpa ou amor.
O ser inocente não tem paredes que bloqueiam a livre extensão do amor, mas essas paredes são uma parte inerente do ser cercado por pensamentos de pecado e culpa, nascido de um auto-conceito de inferioridade e mal. Esse é o ser que fez seu lar no mundo, sobrevivendo através de paredes de defesa que mantêm o ser da mente cheia de ódio oculto da consciência, e os seres projetados do mundo, cercados.

Por trás da parede está a única segurança desse ser, pois corpos foram feitos para serem vulneráveis. Vivendo em um mundo hostil, ameaçador, de outros corpos. Portanto, nós esculpimos e guardamos um lugar secreto que ninguém pode tocar. Na verdade, foi assim que alcançamos nosso objetivo de qualquer jeito na infância, adolescência ou vida adulta, pois, de outra maneira, não poderíamos proteger a nós mesmos do mau tratamento recebido das figuras mais poderosas e das forças no mundo. Nossa única esperança de sobrevivência tem sido nos isolarmos dessas incursões à nossa segurança, pois nada pode ferir nossas mentes. Portanto, você pode ser tão abusivo e prejudicial quanto quiser, mas, dentro das minhas paredes secretas, onde eu reino sozinho, nunca preciso perdoá-lo. Você pode fazer com que meu corpo se submeta à tortura e dominação, pode me fazer dizer o que você determinar, mas não pode afetar meus pensamentos dentro do meu reino. Esse forte é inexpugnável e impenetrável, e meu especialismo sacrossanto, não permitindo que ninguém, especialmente figuras de amor, ameace meus bastiões de ódio. Na verdade, mãos gentis e amorosas não são permitidas, pois o ódio iria se dissolver sob seu toque e meu pequeno ser seria exposto ao abuso, rejeição e aniquilação.

Portanto, nós juramos nunca liberar o forte, o qual protegemos por nossos julgamentos. Ao crescermos, nos tornamos cada vez mais engenhosos nesses ataques, inventando justificativas para permanecermos dentro do nosso forte de especialismo.

O medo de perdermos nossa identidade pessoal é o medo de perdermos as paredes que nos mantêm a salvo e seguros. Nossos pensamentos de ataque – a nós mesmos (culpa) e aos outros (julgamento) – mantêm essa parede intacta. Nós ficamos aterrorizados com a possibilidade do perdão afrouxar até mesmo alguns poucos tijolos, pois então todos iriam desmoronar, deixando-nos vulneráveis e desamparados, “à mercê de coisas além [nós], forças que [nós] não podemos controlar” (T-19.IV-D.7:4).

Nós mantemos nossos seres culpados ocultos por trás dos relacionamentos especiais, e, enquanto existir uma pessoa a quem negamos o perdão, estaremos a salvo, pois só é preciso uma para assegurar nosso ser separado. Nosso único meio de sobrevivência, portanto, é cavarmos um pequeno nicho que pertença somente a nós, no qual ninguém jamais pode entrar, para que não sejamos feridos outra vez. Não existe pessoa caminhando sobre a terra que não tenha construído uma parede assim, dizendo tanto para seus amigos quanto para seus inimigos, e finalmente para Deus: “Tu não vais entrar”.

Jesus nos diz que “Aprender esse curso requer disponibilidade para questionar todos os valores que tu manténs. Nenhum pode ser mantido oculto e obscuro sem pôr em risco o teu aprendizado” (T-24.in.2:1-3). Nosso valor fundamental é estarmos a salvo dentro da parede secreta que protege nossa existência separada. Todos os outros valores – políticos, educacionais, religiosos, sociais, pessoais – derivam desse mundo por trás do forte, o qual defendemos tão ferozmente que não apenas ninguém pode entrar, mas nós também não podemos sair. Portanto, nós existimos trancados em nossa prisão, indefesos diante de nossas defesas, consumidos pelo ódio quanto mais odiamos. A mentira, que nunca questionamos, é que, de alguma forma, estamos a salvo por trás da parede, não afetados pelo ódio percebido do lado de fora dessa barreira. O ego nos ilude para acreditarmos que nossos corpos nos mantêm a salvo, uma vez que eles são os objetos da malignidade e destrutividade do mundo, mas essa insanidade camufla a identidade central do ser vulnerável, fustigado pela culpa em relação ao seu pecado.

Para recapitular, nós começamos temendo o amor interno e construímos uma parede de proteção. Projetando nosso medo, nós olhamos para os erros das pessoas, chamando-os de pecados, o que justifica erigirmos uma parede de julgamento entre nós mesmos e elas. Por trás dessa parede, nós nos escondemos em medo, aterrorizados demais para nos aventurarmos além de seus estreitos confins. Como, então, poderemos jamais nos movermos para além da parede para o lugar de amor, oculto além do lugar de ódio na mente, o qual, em si mesmo, está protegido pela parede dos corpos especiais?
Parte do texto A Parede Secreta (Volume 15, número 2, junho 2004) - Kenneth Wapnick, Ph.D. - Tradução: Eliane Ferreira de Oliveira

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